Um dos marcos da atividade de mascate em Itapetininga foi
Karnig Bazarian, que não pode faltar de qualquer referência histórica.
Nossa homenagem ao dedicado comerciante com as palavras de
João Netto Caldeira em seu Álbum de Itapetininga.
“O distincto moço snr. Karnich A. Bazarian, aqui muito estimado, nasceu na Armenia em 15 de janeiro de 1908, sendo consorciado com a exma. Sra. D. Roza Bazarian e tendo dois galantes filhos: Antoninho e Suzanna.
Em 1929 fundou a Casa Armênia, situada á rua Saldanha Marinho, 153, phone nº 74, prosperando rapidamente em virtude dos methodos honestos do commercio que adoptou.
Especialisada em calçados finos e grossos para homens, senhoras e creanças e tendo enorme stock desses artigos, dispõe a Casa Armênia de completo sortimento de fazendas de lã, seda e algodão, chapéus de todos os estylos, finíssimas perfumarias nacionaes e extrangeiras, roupas brancas, confecções em geral, armarinho, roupas feitas, bijouteria e infinidade de outras mercadorias das melhores procedências.
É zeloso auxiliar do estabelecimento o snr. Sylvio Fernandes dos Santos.
A “Casa Armênia” dispõe de freguezia selecta e numerosa, não só em Itapetininga como em toda a zona.
Além desse estabelecimento, possue o snr. Karnich A. Bazarian magnífico prédio nesta cidade.”
Álbum de Itapetininga – 1934
Pagina 147
Karnig Bazarian nasceu no dia 15 de janeiro de 1908 em Marach, Arménia Ocidental.
Filho de Artin e Hosana Bazarian.
Ele tinha os irmãos: Paren, Krigor, Azniv, Jacob Bazarian.
Personalidade das mais marcantes da comunidade arménia no Brasil e símbolo vivo da
atividade comercial em nossa cidade.
O Comendador Kamig Bazarian foi um dos fundadores da Associação Comercial e Industrial de Itapetininga.
Como a história dos imigrantes armênios, expulsos de sua terra natal pelos turcos, Karnig teve uma infância de perseguição e fuga, que iniciou na Síria, passando pela França (onde foi operário) até chegar a Itapetininga, no ano de 1929.
Vamos reproduzir um texto que foi publicado na revista da Associação Comercial de Itapetininga.
ACIAI - Notícias: Comendador, como o senhor conheceu Itapetininga?
Karnig Bazarian: Em busca de melhores perspectivas de vida, em setembro de 1928, com 20 anos, mudei para o Brasil juntamente com minha irmã Azniv e meu irmão caçula Jacob.
Em São Paulo fomos recebidos pelo meu tio Levon Apovian.
Mas era necessário, mais do que nunca trabalhar, e lá vou eu, com meu primo Krikor, mascatear pelas cidades do interior.
Foi dessa forma que conheci Itapetininga.
ACIAI Notícias: E o senhor gostou desta terra?
Karnig Bazarian: E como. Era a "Terra Prometida" e resolvi estabelecer-me nesta "Terra de Povo Abençoado".
ACIAI Notícias: Quando foi isso?
Karnig Bazarian: Foi no ano de 1929. Com a vinda de meu pai Artin e meus irmãos Paren e Krikor de Marselha, na França, todos decidimos mudar para Itapetininga, onde começamos a trabalhar como mascate pelas ruas da cidade.
ACIAI Notícias: O que mais o marcou nessa época?
Karnig Bazarian: Além das vendas pelas ruas, as festas do Divino organizadas pela Igreja de Nossa Senhora dos Prazeres, onde armávamos uma barraca de miudezas. Em altos brados, numa mistura de línguas arménia, francês e português, atraíamos mais e mais fregueses que acorriam à banca do barateiro à procura de meias, lenços, gravatas e outras miudezas.
ACIAI Notícias: Quando surgiu a "Casa Arménia?
Karnig Bazarian: Nossa força de vontade, associado à honestidade, era inesgotável. Pouco a pouco as custas de muito sacrifício conseguimos alugar uma casa na Rua Saldanha Marinho 153 (hoje 791) pertencente ao senhor José Colaço. Como o aluguel era muito caro para nós, ficamos apenas com a sala da frente. Apareceu assim a "Casa Arménia", montada na metade de uma sala, com a outra metade servindo de residência para a família Bazarian.
ACIAI Notícias: E continua com o comércio de miudezas?
Karnig Bazarian: Sim e muito mais: tínhamos desde agulha e linha até roupas e calçados.
- Quando aconteceu isso?
Karnig Bazarian: No ano de 1930. Ano esse também que conheci minha esposa Novart Aghazarian, com quem me casei no mesmo ano em Outubro.
ACIAI Notícias: E a "Casa do Barateiro?
Karnig Bazarian: Os negócios prosperaram e aconteceu o nosso segundo estabelecimento comercial: "A Casa do Barateiro", localizada no Largo dos Amores, na esquina da Rua Venâncio Ayres, onde hoje estão as novas dependências do Clube Venâncio Ayres. Isso em 1932.
ACIAI Notícias: O senhor participou da fundação de nossa ACIAI. Como isso aconteceu?
Karnig Bazarian: No ano de 1933 conhecidos comerciantes, com os objetivos de unificar a classe, defender seus interesses, influir para que todos se auxiliassem mutuamente, resolveram fundar uma Associação Comercial nos moldes da existente em Marília e São Paulo. A ideia agradou e no dia 9 de Julho desse mesmo ano, estávamos todos nós no Clube Venâncio Ayres dando início à essa iniciativa. Participamos desse histórico evento graças a amizade que tínhamos com outros fundadores como Paulo Soares Hungria, Professor Francisco Válio entre tantos outros.
ACIAI Notícias: Soubemos que nessa época o senhor retomou as atividades de vendedor na região. Como foi isso?
Karnig Bazarian: Em 1934 o "Barateiro" ficou a cargo de meu pai. Neste mesmo ano meus irmãos Paren e Krikor abriram outra loja, também batizada de "Casa Arménia" na vizinha cidade de Tatuí.
Dessa forma decidi vender no atacado aos comerciantes da região. Comprei um velho "Ford 28", pôr 5.000 mil réis, valor somente dos quatro pneus. Seu antigo dono, Jacy, me ensinou a dirigir e adquiri a carteira de habilitação. E saí região afora.
ACIAI Notícias: Como surgiu a mais conhecida "Casa Arménia" da rua Campos Sales?
Karnig Bazarian: Um desejo forte e inabalável de melhor nosso nível de vida fez com que procurássemos mais e mais a expansão de nossos negócios. Em 1935, queria um empreendimento só meu. Procurei o gerente do Banco Comercial, Senhor Ramiro, que muito me ajudou para conseguir um empréstimo no valor de 37 mil réis, para a compra do Bar Vendramini, localizado na esquina da Avenida Peixoto Gomide com a rua Campos Sales. Pagando 5 mil réis pôr mês, com muita dificuldade, consegui liquidar a conta no Banco. Instalei a loja e depois tratei de expandir o prédio. Contratei o empreiteiro Benedito Sobrinho para a construção de outros pavimentos. Tudo foi demolido e o empreiteiro ergueu, desde os alicerces até o acabamento, tudo o que é hoje.
ACIAI Noticiais: E quando foi inaugurada a loja?
Karnig Bazarian: Em 1937, um ano difícil para mim, inaugurei a loja. Pôr ser uma das melhores casas e lojas de Itapetininga, o então prefeito Paulo Soares Hungria e a Câmara Municipal me concederam 15 anos de isenção do imposto predial.
Mas, mesmo assim, naquela noite de inauguração, as preocupações com as dívidas não me deixavam dormir. Contudo, graças ao povo de Itapetininga, naquele mesmo dia consegui fazer um bom movimento o que deu para cobrir a primeira prestação das minhas dívidas.
ACIAI Notícias: Suas atividades comerciais terminaram em 1973, mas o senhor nunca deixou de ser um comerciante. Como se sente?
Karnig Bazarian: Após muitas outras atividades, em 1973 vendi a minha querida loja "Casa Arménia" para aquele que sempre comigo trabalhou honestamente, o meu gerente João Catarino Cleto de Barros, para realizar um outro sonho, o de construir um sítio, que denominei de "Sítio do Vovô".
O Comendador Kamig Bazarian é um nome que não só fez a história do comércio itapetiningano, mas também registrou, pela sua inesgotável força de vontade, a atividade profissional de quem sempre acredita em um sonho e em um projeto. Sua participação na caminhada de um povo, arménio em primeiro lugar, itapetiningano em segundo, com muitas conquistas, como a FKB, merece todo o nosso respeito e homenagem.
Como dizem e disseram seus contemporâneos: "
Kamig Bazarian é um exemplo de luta, esperança e alegria, sejam nos momentos de dificuldade ou de facilidade. É um eterno mascate que valorizou a atividade de comerciante".
A foto mostra a Família Bazarian, na época do massacre ocorrido na Armênia, quando refugiou-se na Síria. O garoto no colo do pai é Jacob Bazarian.
Karnig Bazarian faleceu em Itapetininga no dia 15 de janeiro de 2001.
Seu corpo foi trasladado para São Paulo sendo sepultado no cemitérios do armenios na capital.